Comunidade do Poço da Draga mantém viva a reunião musical e literária iniciada há oito anos, mesmo em meio às dificuldades da pandemia. Fundação Sintaf apoia o encontro desde o seu início
Tudo começou em 2014, com a atriz, cantora e escritora Joana Angélica. Os encontros tinham, em princípio, o objetivo de trabalhar o encanto das palavras junto aos jovens do Poço da Draga. A ideia era despertar neles o desejo de construção do homem enquanto sujeito e cidadão. Até que a condução do projeto passou à responsabilidade do músico Rodrigo BZ; o Sarau se expandiu, alcançando a poesia e, principalmente, a música, agora englobando também os adultos.
Os encontros aconteciam, timidamente, no Pavilhão Atlântico, área na entrada da comunidade. Com a mudança para a casa de dona Francisca Iolanda Belo Pereira, os participantes conheceram melhor a essência da ação e se integrarem ainda mais. Dona Iolanda, moradora do lugar há 48 anos, declama trecho da poesia “O Melhor Lugar do Mundo”, do cordelista cearense Lucarocas, em agradecimento “à bênção que é o Sarau”:
O melhor lugar do mundo
É dentro de um abraço
Onde o calor de um segundo
Escreve do amor o traço
“Entra cachorro, gato, é muito aberto para todos”
O evento é um esforço conjunto, conduzido por Rodrigo BZ em parceria com a Fundação Sintaf, que o financia. Ele afirma que o Sarau não aconteceria sem o envolvimento das moradoras da comunidade, que se organizam em favor de um momento que, bem sabem,, é rico em possibilidades de cidadania, de inclusão social, de despertar para a arte/cultura e de descoberta de talentos.
“Adorado” pelas senhoras do Poço da Draga, o Sarau tem promovido a alegria de muitas moradoras, tornando-se acontecimento aguardado com grande expectativa. Elas se divertem com a poesia, o cordel, a dança e a música. Às vezes levam seus netos para experimentarem um “ambiente de afetos” que desperta o lado sensível e criativo. “Entra cachorro, gato, é muito aberto para todos”, informa Rodrigo BZ, bem-humorado. “O objetivo é realmente que os participantes tenham essa válvula de escape por meio da arte”.
Exposição de caso
O impacto positivo no dia a dia dos envolvidos no Sarau do Poço chamou a atenção de alunos dos cursos de Música e Serviço Social da Universidade Federal do Ceará (UFC), que rendeu uma exposição sobre a intervenção no Museu de Arte Contemporânea do Ceará (MAC), no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. O estudante André Benedect, que veio ao sarau como parte de um trabalho do curso de Música, gostou tanto da experiência que perguntou se poderia continuar participando.
“Infelizmente, a pandemia forçou o evento a parar em 2020”, lamenta Rodrigo. Durante o isolamento, sem recursos para criar uma versão online que se aproximasse em resultado do presencial, o condutor conservou o Sarau vivo na memória de cada um, mantendo contato por telefone, fazendo vídeos musicais e os enviando aos participantes, para que compartilhassem entre si. Foi um sucesso.
Os encontros presenciais voltaram em 2021, para a satisfação de todos, mantendo o carinho e o acolhimento de sempre, mas obedecendo as regras do distanciamento social e uso de álcool em gel e máscara. “Enquanto tiver gente para mantê-lo vivo, o Sarau do Poço vai continuar”, assegura Rodrigo BZ.